Bets: Vício em apostas on-line tira foco de funcionários, afeta produtividade e causa demissões g5o1r
Profissionais acumulam dívidas, se distraem no emprego, sofrem de insônia e enfrentam conflitos e isolamento 3912s
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O vício em apostas esportivas online custou o equivalente a sete anos da reserva financeira do gestor comercial Gustavo Henrique, 25. O que começou como uma brincadeira se transformou em dependência: ele ite ter fingido trabalhar enquanto apostava pelo celular durante o expediente.
Demitido há menos de um mês, Gustavo agora enfrenta mais de R$ 80 mil em dívidas e uma profusão de incertezas. "Foi a primeira vez que me vi viciado em algo. Não conseguia parar. Corro o risco de ter as contas bloqueadas pelo banco, tenho aluguel para pagar... Não sei como vai ser", desabafa o gestor.
O profissional é uma das milhares de faces da "epidemia das bets", termo usado por especialistas para descrever o crescimento desenfreado de pessoas envolvidas em apostas esportivas online.
O fenômeno já representa um problema de larga escala e se manifesta no ambiente de trabalho tanto de formas evidentes quanto por sintomas silenciosos.
No Brasil, 54% dos gestores dizem que os colaboradores aproveitam o horário de descanso, como a pausa do almoço, para apostar. A informação é de uma pesquisa divulgada neste ano pela Creditas Benefícios, em parceria com Wellz by Wellhub e Opinion Box, que ouviu 405 gestores e profissionais de RH.
Sobre os impactos no ambiente de trabalho, 66% apontam que o vício compromete a saúde mental e física dos funcionários. Em seguida, aparecem a queda na produtividade, com 59%, o aumento da rotatividade, 21%, e a piora na reputação da empresa, 16%.
Em sete meses, Raissa acumulou dívidas em sete bancos, estourou todos os cartões e precisou contar à família.
Em janeiro de 2022, decidiu fechar a loja por não ter mais condições de arcar com as contas mensais. Desde então, desinstalou os aplicativos de apostas e voltou ao mercado de trabalho formal, no qual segue há três anos.
Qual a responsabilidade das empresas? a565c
Para evitar casos como os ilustrados nesta matéria, as empresas precisam encarar o fenômeno das bets por uma perspectiva mais ampla de responsabilidade social, argumenta Luciana Morilas, professora de direito na FEA-RP/USP (Faculdade de Economia, istração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo).
Apesar da popularização das bets, o Brasil ainda não possui uma lei que regule diretamente o uso de apostas esportivas no ambiente de trabalho.
A regularização das apostas de quota fixa, as bets, foi sancionada em dezembro de 2023, por meio da Lei nº 14.790. No entanto, a norma trata principalmente da tributação e funcionamento do setor, sem abordar condutas relacionadas ao mercado de trabalho.
Com relação a demissões por causa de apostas durante o expediente, a docente frisa que a empresa pode demitir com base em critérios como a quebra de conduta, o impacto no desempenho ou questões disciplinares, desde que respeitados os direitos do trabalhador e o devido processo legal.
Especialistas ouvidos pela reportagem apontam que as empresas devem adotar uma postura preventiva diante dos impactos das apostas entre colaboradores. As principais recomendações incluem:
- Oferecer apoio psicológico e canais de escuta
- Capacitar líderes para identificar sinais de vício
- Criar políticas internas e ações educativas sobre o tema (canal de educação financeira e rodas de conversa)
- Evitar julgamentos e promover letramento digital
Do ponto de vista da saúde, o CEO da Zenklub, Rui Brandão, ressalta que o vício em apostas é uma forma de sofrimento psíquico e que as empresas devem tratá-lo como qualquer outra questão relacionada à saúde mental.
Maíra Blasi avalia que o poder público é o principal responsável para realizar mudanças efetivas. "O governo precisa criar limites, sem isso, fica difícil", conclui.
Já para Luciana Morilas, o governo também precisa avançar na criação de leis mais amplas, que contemplem políticas de saúde pública voltadas ao tratamento da dependência, mecanismos de prevenção e normas para proteger trabalhadores afetados.
A reportagem entrou em contato com o Ministério do Trabalho e Emprego para saber se há políticas ou iniciativas voltadas à prevenção ou enfrentamento dos impactos causados pelas apostas online no ambiente de trabalho.
Também questionou possíveis parcerias com outras pastas, como Saúde e Justiça, e se há previsão de fiscalização ou regulamentação específica para o uso dessas plataformas durante o expediente. Até a publicação desta matéria, não houve resposta.
