Por dentro do esforço bilionário para fazer Trump se sentir bem consigo mesmo 39191w
Governo está mobilizando vastos recursos públicos e mais de US$ 1 bilhão em dinheiro dos contribuintes para bajular o presidente 281i6l
Pam Bondi parecia um pouco nervosa durante a reunião do Gabinete de Donald Trump em 30 de abril, na semana em que o governo estadunidense comemorava os primeiros 100 dias de presidência. O vice-presidente J.D. Vance estava sentado diretamente à frente de Trump, e Bondi, imediatamente à esquerda de Vance — o que significava que o presidente praticamente a encararia enquanto ela apresentava seu relatório sobre o Departamento de Justiça. 3c3g12
Bondi, procuradora-geral dos Estados Unidos, é uma entre mais de duas dezenas de bilionários, teóricos da conspiração, apresentadores de TV e personalidades fieis ao movimento MAGA que os republicanos permitiram que Trump nomeasse para os cargos mais importantes do governo. Por isso, todos eles tinham lugar reservado nesta reunião de Gabinete, onde bonés com o slogan "Gulf of America" estavam dispostos em cores alternadas ao redor da mesa. Trump não escolheu essas pessoas por suas qualificações — que, geralmente, são quase inexistentes (Bondi havia sido procuradora-geral estadual) —, mas por sua capacidade de bajulá-lo, algo que todos ali dominam com maestria. Essas reuniões televisionadas servem como palco perfeito para demonstrações públicas de lealdade.
Trump estava sentado com os braços sob a mesa, chamando seus subordinados um a um. Eles o agradeceram efusivamente. Elogiaram sua liderança e coragem. Riram junto quando ele zombou dos juízes federais que haviam barrado partes de sua agenda, como os esforços de enviar imigrantes para prisões no exterior sem o devido processo legal. Bondi estava pronta para sua performance após Vance, com calma, explicar à imprensa presente que ela deveria estar cobrindo os feitos históricos de Trump — e não "besteiras falsas". Bondi não estava tão calma. Limpou a garganta.
"Sr. Presidente, seus primeiros 100 dias superaram em muito os de qualquer outra presidência neste país… jamais", disse ela, com ênfase forçada. "Nunca vimos nada parecido. Obrigada. Sua orientação para mim foi muito simples: tornar os EUA seguro. Apesar disso, ainda estamos defendendo mais de 200 ações civis movidas contra o senhor".
Bondi leu algumas estatísticas sobre as apreensões de fentanil pelo governo: "o que salvou — estão prontos para isso, mídia?" Ela se virou para a câmera. "258 milhões de vidas". Depois, voltou-se para Trump. "Crianças estão morrendo todos os dias porque estão tomando esse lixo. Estão caindo mortas, e não mais, por sua causa, pelo que o senhor fez."
Não está claro qual cálculo Bondi usou para afirmar que Trump salvou a vida de 258 milhões de americanos — número equivalente à cerca de 75% da população do país. No dia anterior, ela havia dito que Trump salvará um número bem mais modesto: "119 milhões de vidas". Uma fonte com conhecimento do assunto disse que Bondi inflou o número de propósito na reunião do Gabinete não só para bajular Trump, mas também para provocar a imprensa. De qualquer forma, a hipérbole foi tão absurda que até membros da Casa Branca riram depois descontroladamente da situação.
De acordo com outras duas fontes, vários assessores de Trump reagiram à declaração de Bondi vasculhando a internet em busca de sinais de que democratas e jornalistas estariam — nas palavras de uma das fontes — "pirando". A intenção era reunir reações indignadas, imprimir tudo e mostrar a Trump, sabendo que ele ficaria encantado com a comoção. A reunião do Gabinete, portanto, foi considerada um sucesso.
A maneira como Trump conduz essas reuniões com seus principais auxiliares "definitivamente remete à vibe de Líder Supremo, tipo o que se vê com Kim Jong Un ou [Vladimir] Putin", diz Virginia Canter, diretora jurídica de ética e combate à corrupção no Democracy Defenders Fund. Para ela, isso mostra que o presidente "precisa ser constantemente reafirmado quanto à lealdade" e vê seus secretários como "basicamente seu staff pessoal, ali para massagear seu ego".
As exigências de bajulação de Trump estão custando uma fortuna. Sua nova istração tem apenas alguns meses e já o custo total de apenas três dessas iniciativas — uma campanha publicitária chamativa do Departamento de Segurança Interna para enaltecer Trump, um desfile militar gigantesco em Washington, D.C., no aniversário de Trump, e a adaptação de um avião palaciano do Qatar como o novo Air Force One para uso pós-presidencial de Trump — facilmente ultraará US$ 1 bilhão. E isso é só o começo.
Os esforços abrangentes para bajular Trump vão além de alimentar seu ego, segundo Anthony DiMaggio, autor de Rising Fascism in America: It Can Happen Here:
"Tem a ver com um presidente que precisa não apenas estar no centro de um circo midiático, mas que precisa ser lembrado ritualisticamente, repetidamente, de como ele é grandioso. O que me interessa nisso, como cientista político, é que não se trata apenas de uma questão de personalidade ou de um defeito. É um padrão mais amplo que envolve comportamentos que se sobrepõem à política e ideologia autoritárias."
DiMaggio afirma que estudiosos do autoritarismo há muito identificam "a ideia de que o primeiro mandato é um teste, em que a pessoa descobre o que funciona e o que não funciona para alcançar seus objetivos políticos, e então percebe que precisa se livrar de qualquer um que não seja um bajulador. É necessário ter bajuladores em todos os níveis, que não farão perguntas, porque do contrário, os resultados políticos desejados não se concretizam. Se você quer atuar numa política autoritária, precisa eliminar as pessoas que Trump chama de 'Estado profundo' — os burocratas que estão no caminho e ainda têm algum compromisso com freios e contrapesos e com o Estado de Direito".
O esforço generalizado para saciar o ego de Trump — em reuniões de gabinete, aparições na TV e em vários ramos do governo — tem sido essencial para suas investidas autocráticas. Trump e sua istração mergulharam os EUA em uma série de crises constitucionais, praticaram corrupção aberta e supervisionaram um retrocesso democrático genuíno — tudo sustentado por propaganda projetada para inflamar ainda mais seu culto à personalidade.
Não se trata do bem-estar da nação. Trata-se de promover um presidente americano cuja Casa Branca o chama de "o Rei" e ajudá-lo a acumular poder para corresponder a esse título.
Quando questionado, um funcionário da Casa Branca respondeu: "Tudo o que o presidente Trump faz é em benefício do povo americano, e ele garantiu muitos acordos bons em nome deles".
'Coreano do Norte' 401w2o
Em todo o governo, agências estão assumindo como missão propagar o trumpismo e obedecer às suas ordens. Não há exemplo melhor do que o Departamento de Justiça sob Pam Bondi, que, ao contrário da história recente, opera sem qualquer aparência de independência e a a aplicar a linha política de Trump e reforçar sua propaganda.
Um dia após ser confirmada, Bondi emitiu um memorando instruindo os funcionários do Departamento de Justiça a defenderem "zelosamente" as opiniões e políticas de Trump e a atuarem como "os advogados dele". Ela anunciou a criação de um "grupo de trabalho de instrumentalização" no DOJ, com objetivo de investigar os promotores que processaram Trump, assim como os que investigaram e indiciaram apoiadores de Trump que invadiram o Capitólio dos EUA em 6 de janeiro de 2021, tentando mantê-lo no poder. Trump exigiu, via ordem executiva, que agências independentes seguissem interpretações legais favorecidas pelo "presidente e pelo procurador-geral (sob supervisão e controle do presidente)".
Sob Ed Martin — um advogado negacionista das eleições e devoto de Trump —, o Escritório do Procurador dos EUA no Distrito de Columbia assumiu um viés explicitamente pró-MAGA. Martin se descreveu publicamente, com sua equipe, como "os advogados do presidente Trump", ali para "proteger sua liderança como nosso presidente". Um grande pôster da ordem executiva de Trump "Tornando o Distrito de Columbia Seguro e Bonito" — elaborada para expandir o encarceramento pré-julgamento, remover acampamentos de sem-teto e reprimir crimes menores — foi pendurado na parede ao lado dos elevadores, segundo uma foto obtida pela Rolling Stone.
O comportamento de Martin incomodou outros que trabalhavam há anos no Departamento de Justiça, alguns dos quais aram a usar um termo simples para descrever o que ele fazia: "Coreano do Norte". Como nota um alto funcionário da Casa Branca: "Ed exagera um pouco; por isso o presidente o adora".
Trump parece acolher comparações com regimes totalitários no exterior. Segundo esse funcionário, nos últimos meses, quando conselheiros alertaram Trump de que alguns críticos comparavam seu entusiasmo por desfiles militares aos costumes da Coreia do Norte ou de outros estados repressivos, o presidente respondeu que esses países fazem isso porque "respeitam" seus líderes e que essas demonstrações de força militar nacional são boas para a moral da população. (Trump não parece reconhecer que esses regimes fazem isso porque o ditador os obriga.)
Depois que Martin não conseguiu apoio suficiente dos republicanos para manter o cargo de procurador, Trump o nomeou advogado de indultos — e agora Martin promete publicamente: "Nenhum MAGA será deixado para trás".
"Tudo no funcionamento atual do Departamento de Justiça é diferente de como funcionava no ado", diz Liz Oyer, ex-advogada de indultos do departamento, que foi demitida por se recusar a permitir que o ator Mel Gibson voltasse a possuir armas. "As ordens parecem vir de cima para baixo. Estão tratando o departamento como se fosse o escritório de advocacia pessoal do presidente Trump".
Está ficando cada vez mais difícil, a cada dia, caracterizar o segundo mandato de Trump como qualquer coisa além de uma caricatura americana da adoração totalitária ao herói, como nos regimes da Coreia do Norte. Sob esse tipo de ditadura, por exemplo, boa parte da arte e entretenimento existe simplesmente para agradar o Querido Líder.
Quando Trump não está ocupado ordenando que o governo inicie uma investigação criminal sobre Bruce Springsteen e suas atividades políticas, ele e sua istração estão fazendo coisas como tentar tomar o controle do Kennedy Center em D.C. — em grande parte porque Trump nunca superou que muitos artistas que se apresentaram lá o odiavam abertamente e repudiavam suas políticas.
Segundo uma fonte familiarizada com o assunto e outra pessoa informada a respeito, Trump contou a vários de seus associados próximos alguns de seus planos para o Kennedy Center, enquanto atua informalmente como presidente do conselho. Em primeiro lugar, ele afirmou querer "revisar" as listas de programações das próximas temporadas, apresentações planejadas e artistas escalados — em parte para que o centro possa filtrar performers anti-Trump que possam criticar o presidente no palco. Trump também exigiu que a programação do Kennedy Center fosse mais "pró-Americana" e disse a pessoas próximas que aceitaria até apresentações dentro do Salão Oval propondo novos musicais ou peças — especialmente se o material original for anti-"woke".
Ele também perguntou a pelo menos dois confidentes se faria sentido batizar uma ala reformada ou seções do centro com seu nome — e até se seria apropriado colocar uma "estátua" dele no prédio, da mesma forma que há um famoso busto grande de JFK no local. (Talvez porque o lugar tenha o nome do presidente John F. Kennedy),
"O presidente Trump se importa profundamente com as artes e a cultura americanas, por isso está revitalizando instituições históricas como o Kennedy Center para retomarem sua antiga grandeza", diz o funcionário da Casa Branca, acrescentando: "Combater a propaganda antiamericana é essencial para proteger nossas crianças e fomentar o patriotismo".
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