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Na luta contra retrocessos, juízes e universidades se firmam como principais pedras no sapato do governo Trump 5y5t46

É difícil prever até quando a musculatura das universidades e do judiciário conseguirá conter a sanha demolidora de Trump, sem uma rede unificada de resistência e o apoio explícito da população 6h3m6e

30 mai 2025 - 05h39
(atualizado às 08h21)
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Levantamento de Adam Bonica, cientista político da Universidade de Stanford, revelou que o governo dos EUA perdeu mais de 95% de processos nos tribunais federais apenas no mês de maio. As decisões abrangem um amplo espectro de temas e medidas. O fato é que 72,2% dos juízes nomeados por republicanos atuaram contra Donald Trump. Entre os juízes nomeados por democratas, 80,4% votaram contra o governo. Ou seja, foram derrotas expressivas para um judiciário que seguiu as leis e não obedeceu a designações de partidos. 525o6y

Os estudos de Adam Bonica mostram que políticos autoritários invariavelmente atacam os juízes que contrariam seus planos. Mais ainda, o pesquisador aponta que a legitimidade do judiciário também é minada por sucessivas liberações de condenados por crimes graves. Um movimento que, nos EUA, resultou no perdão para invasores do Capitólio no 6 de janeiro de 2021, inclusive para aqueles que feriram policiais. Trump perdoou condenados por conspiração, fraude e crimes fiscais e incentiva seus seguidores a perseguir e ameaçar juízes em todo o território americano.

Esse padrão de atuação se deu na Itália de Silvio Berlusconi (que apenas via comunistas no judiciário), ou pela Turquia de Recep Erdogan (que expurgou milhares de juízes), pelas Filipinas de Rodrigo Duterte (que destituiu a presidente da Suprema Corte), por Israel de Benjamin Netanyahu (que tentou acabar com a independência das cortes), e chegou até as agressões de Jair Bolsonaro contra o Supremo Tribunal Federal no Brasil.

Políticos autoritários, afeitos ao despotismo e candidatos a autocratas, todos procuram desconstituir a independência do judiciário e de todos os pontos de resistência que surgem em seu caminho, a exemplo das universidades que, com seu apego à liberdade da pesquisa e à democracia, fazem forte contraponto às ações autoritárias.

Universidades são pressionadas a se curvar e a prestar vassalagem ao governo 6m5z46

Nos EUA, neste exato momento, o presidente americano procura nocautear a mais renomada universidade do mundo, Harvard. No lance mais recente, o governo proibiu a Universidade de matricular estudantes estrangeiros, que compõem cerca de 25% de seu corpo discente e suspendeu a emissão de visto de entrada para estudantes. Alegações da Ministra de Segurança Interna, Kristi Noem, sugeriram que a universidade havia se recusado a fornecer informações sobre protestos e violência de estudantes estrangeiros no campus e que o governo faria de tudo para "cumprir a lei e erradicar o antiamericanismo e o antissemitismo na sociedade e nos campi".

Harvard abriu imediatamente ação na justiça e caracterizou as ações do governo como ataques sem precedentes à liberdade acadêmica e à Primeira Emenda da Constituição dos EUA, que protege a liberdade de expressão, de religião, de imprensa e de reunião. O ato de violência contra Harvard foi suspenso temporariamente por decisão de uma juíza federal do estado de Massachusetts.

Para Harvard, o atual conflito revela a situação dramática de todas as universidades americanas, pressionadas a se curvar e a prestar vassalagem ao governo. A ingerência é mais ampla do que a liberdade de expressão. Atinge diretamente a autonomia do ensino e da pesquisa e tenta definir o que a universidade pode ou não ensinar e pesquisar. Na verdade, a atuação do governo compromete a ciência e a livre produção de conhecimento e compromete o futuro dos EUA como motor mundial da produção de conhecimento.

Agressões contra universidades de excelência não surgem como um raio no céu azul. O impulso anti-intelectual de Trump também correu por quatro anos pelas veias de Bolsonaro, que via nas universidades não mais do que redutos de comunistas, que negavam valores da família e da pátria.

Extrema-direita procura capitalizar o ânimo antielite 131ta

Na verdade, movimentos de extrema-direita procuram capitalizar o ânimo antielite de parcela da população que não consegue melhorar sua vida como as democracias prometem, embora nem sempre cumpram. Mais ainda, regimes autoritários de todas as tonalidades têm plena consciência de que as universidades são espaços de crítica e dissidência. Não à toa ataques aos centros universitários são tópicos importantes do manual do autocrata, escrito e lido em praticamente todas as línguas vivas e mortas do planeta.

Narendra Modi, o primeiro-ministro da Índia, governa o país desde 2014 e procurou incessantemente carimbar as universidades de elite como contrárias ao país. Na Hungria, Viktor Orbán desmantelou a independência das instituições acadêmicas e da Academia Húngara de Ciências por, supostamente, ameaçarem princípios conservadores. Orbán usou e abusou da legislação até conseguir expulsar do país a Universidade Centro-Europeia em Budapeste, por disseminar ideologias de gênero.

Por mais de dois anos o Estado húngaro transformou o ensino superior em um campo de batalha política. Adotou modelos de guerra cultural para neutralizar o que afirmava ser uma elite liberal-esquerdista, intolerante por natureza, fonte permanente de doutrinação dos alunos. Orbán investiu na formação de think tanks de direita radical, inspirado por teorias como as de Patrick Deneen, professor de Ciência Política da Universidade de Notre Dame, que anima parte significativa dos católicos conservadores que apoiam Trump. Suas ideias chamam atenção para a ação nociva de instituições americanas como as universidades, a mídia, o chamado "Deep State" e o Judiciário.

Em seu livro de 2018, "Por que o Liberalismo Falhou", Deneen teoriza sobre as tendências totalitárias imanentes ao liberalismo. Suas ideias veneram o universo das comunidades locais, dos que estão umbilicalmente ligados à tradição e à moral religiosa. Para os devotos do MAGA, os princípios que regem a política atual são inadequados para promover as transformações que almejam. Os EUA precisam de um líder forte, capaz de comandar e unificar, que não seja constrangido pelo judiciário ou pelo Congresso, pois a separação entre poderes é um luxo liberal que apenas frustra o desejo de mudanças rápidas e urgentes.

Os fatos contam outra história. As universidades modernas foram estruturadas em torno da livre busca pelo conhecimento. Sua legitimidade veio com a discussão informada e o respeito à diversidade. Seu crivo foi o contraditório, que sustentou a liberdade acadêmica e distanciou a ciência do mundo das opiniões e dos dogmas.

Foi com esse espírito que as universidades se consolidaram como pontos de apoio essenciais para assegurar a primazia americana na cena global após a II Guerra. Como centros de excelência foram responsáveis por avanços na medicina, na física, química e na biologia que mudaram a face do mundo. Novos medicamentos e terapias desenvolvidos em seus laboratórios elevaram a expectativa de vida de bilhões de pessoas e contribuíram pela alta competitividade da economia americana.

Anti-intelectualismo de Trump emulou o MAGA raiz e seu azedume contra as elites 603n6d

Para Trump, porém, as universidades são o esteio do liberalismo que promoveu o declínio da nação americana. Seu anti-intelectualismo emulou o MAGA raiz e seu azedume contra as elites. Movimentos ligados a igrejas ascendentes, evangélicas ou não, deram e a movimentos como o Tea Party, que nunca escondeu seu desejo de segregar escolas e de expurgar professores portadores de ideias supostamente antiamericanas.

Em 2021, o atual vice-presidente, J.D. Vance, afirmou que a direita americana havia perdido "todas as principais instituições poderosas do país…". Vance não hesitou em afirmar que, para mudar, os EUA teriam de substituir "completamente a classe dominante existente por outra classe dominante". Na mesma campanha, Vance declarou que seria preciso "…atacar as universidades deste país de forma honesta e agressiva". "Vivemos em um mundo que foi construído com eficiência pelo conhecimento universitário" e, para "…reconstruir a nação nos moldes do nacionalismo cristão branco, as universidades precisam ser destruídas".

Recentemente, Kevin Roberts, presidente da Heritage Foundation, think tank conservador que elaborou o Projeto 2025 e que conta com vários de seus dirigentes em posições-chave do governo, declarou ao podcast War Room, de Steve Banon, que as instituições estavam dominadas e que o movimento em curso liderado por Trump representava uma segunda Revolução Americana "que permanecerá sem derramamento de sangue se a esquerda permitir".

Quem se preocupa com um futuro de liberdade precisa lembrar que a realidade atual vai além das ameaças. As universidades são enormes pontos de apoio democráticos e de defesa do estado de Direito. Mas ninguém sabe até quando conseguirão resistir.

No judiciário, o dilema é semelhante, uma vez que os tribunais distritais formam hoje a principal defesa contra a extrapolação de poderes do Executivo. Porém, todos sabem que a Suprema Corte dos EUA é extremamente simpática e deferente a Trump, o que pode neutralizar rapidamente a resistência das cortes mais baixas.

É difícil prever até quando a musculatura das universidades e do judiciário conseguirá conter a sanha demolidora de Trump sem articulação de uma rede unificada de resistência e o apoio explícito da população. Um dilema para a população dos EUA, mas que reverbera por todo o mundo democrático, a começar pelo Brasil.

The Conversation
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Foto: The Conversation

Glauco Arbix não presta consultoria, trabalha, possui ações ou recebe financiamento de qualquer empresa ou organização que poderia se beneficiar com a publicação deste artigo e não revelou nenhum vínculo relevante além de seu cargo acadêmico.

The Conversation Este artigo foi publicado no The Conversation Brasil e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons
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